sexta-feira, 5 de agosto de 2016

BANZO




(Goiânia – Só deixo o meu Cariri, no último pau de arara) – Quando em 1956, os cearenses Venâncio e Corumbá, em parceria com o poeta paraibano José Guimarães gravaram o clássico “O Último Pau da Arara, marcaram de forma indelével a história da música popular brasileira.



Talvez nenhuma outra letra consiga expressar com um grau de profundidade tamanho o sofrimento de um nordestino que se afasta do seu berço natal, sua fonte sagrada.



“Enquanto a minha vaquinha, tiver o couro e o osso... e puder com um chocalho, pendurado no pescoço..... eu vou ficando aqui..... que Deus do céu me ajude..... quem foge à terra natal, em outros cantos não pára.... só deixo o meu Cariri.... no último pau de arara”




Recentemente deixei meu “Cariri”, meu berço, com suas mazelas e encantos, que somente os filhos mais apaixonados conseguem enxergar, aceitar, absorver e amar.



Fui, pois o meu “pau de arara” partia, num momento de incertezas tamanhas, onde ficar não era opção, era abandonar toda e qualquer possibilidade de um futuro de paz, harmonia e alternativas para o núcleo familiar que amo e concebi.



Fui de bom grado e com a certeza de que era a opção certa, e sou muito grato ao Destino por tudo que tem me proporcionado desde então: pessoas maravilhosas, oportunidades novas, novos cenários, gostos, climas, paisagens, sons. Novos sorrisos e projetos. Algo mais sereno e viável no meio de um cenário de profundas incertezas que permeia a nossa atual realidade.



Mas o banzo, não dito, não cantado, não poetizado pelos ilustres cantantes nordestinos acima descritos permanece, dói e aperta o coração de uma essência de baianidade que não se descreve, apenas se sente.



Mas, o que é banzo? Banzo pode ser descrito como o sentimento de saudade.... mas não da saudade que te deixa com um sorriso no rosto, fruto de uma lembrança remota e adoravelmente saudosa. O banzo envereda-se pela melancolia, aprofunda-se na depressão, e origina-se no sentimento dos negros que, extirpados da sua terra natal, nutriam profunda saudade da sua matriz africana.



Nasci e cresci em Salvador, num bairro tipicamente baiano, onde história e cultura caminhavam de forma intrínseca. Vivi sons, aromas e sabores de uma Salvador básica, poética, caricata e musical.



Carnaval, São João, becos, vielas, cidade alta e baixa, igrejas, rua do Tira-Chapéu, sorvete na Ribeira.... agogôs, orixás, capoeira, trio elétrico, abará, Moraes Moreira, mamãe-sacode..... Tiete Vips, Caminho de Areia, cacetes armados, “porra nenhuma”, amendoim cozido, lenhado, pãozinho delícia....



Meu vocabulário..... minha referência...



Não é fácil. Dói muito. Mas enfrento tudo isso com o mesmo sorriso no rosto. Não há remédio melhor para o banzo que a injeção da alegria com a qual devemos regar cada broto do nosso dia. Nunca soube ser diferente, e não hei de ser.



Meu Goiás amado, nunca lhe serei descortês. Abriste os braços e me recebeste sem máculas, ressalvas ou senões.



Mas a identidade que me define prescinde beber da fonte, pois a zorra da saudade é retada, viu meu rei?

Nota: A crônica de hoje é uma síntese de que a força que me faz sorrir sempre que deriva de um misto de certezas...



A certeza dos ensinamentos da sábia Ana Rita, minha mãe, que diante de tantos revezes consecutivos na vida sempre encontrou o caminho da reconstrução com uma altivez e jovialidade raramente existentes.



A certeza da lição de um sujeito que sabia encantar, agregar e fazer sorrir.... o saudoso Luiz Gagliano, meu pai, que uniu tantos corações com o calor de um sorriso.



A certeza do apoio da minha maravilhosa esposa, amiga e companheira de todas as horas, minha amada Bruna que, em conjunto com esses pequenos levados fazem-me ter a certeza de que sem eles só haveria vazio.



A certeza do carinho e da ternura do pequeno grande Mateus que, ainda que distante, preenche meu peito com a paz e o orgulho de ter a certeza de que plantei uma semente que hoje frutificou brilhantemente.

Um comentário:

Ana Rita Gagliano disse...

Filho, isso faz parte do crescimento assim como vc eu tb deixei a minha pátria mãe e provavelmente não mais voltarei lá, mas sempre fui feliz aqui nesta terra q me acolheu, aos meus pais e demais familiares de braços abertos. Cresci, estudei, criei família, por sinal maravilhosa,um marido, amigo, companheiro, que Deus quis que retornasse à casa Paterna muito cedo, 2 filhos q só me dão alegria e orgulho das pessoas que se tornaram,Fábio Iglesias Gagliano e Andre Gagliano Magal, Deus não poderia me dar filhos melhores, tenho muito orgulho de vcs. Me deram netos maravilhosos., mas como vc mesmo fala sempre fica no fundo do coração aquela saudade,morriña, banzo ou seja lá qual a palavra que exprima a falta que nos faz nossa terra. (Acho que fiquei repetitiva mas é q as lágrimas me atrapalham no momento rsrs) Amo vocês! 😘😘😘❤❤❤
Terra que não só me deu uma linda família, mas centenas de amigos, muitos dos quais hoje são família também Obrigada aos amigos queridos.