domingo, 22 de janeiro de 2012

Galinha Pintadinha - O Óbvio Fenômeno

(SALVADOR - Cacarejando em azul) - Na década de 80 uma galinha, estranhamente na cor azul, virou fenômeno de marketing publicitário. A Maggi, ao lançar a sua campanha, deu atenção especial ao produto "Caldo Maggi", e associou a este a imagem e os jingles de uma galinha azul que arrebatou de bate-pronto o gosto infantil.


No biênio 2010/2011 uma febre arrebatadora atinge um sucesso há muito desejado mas pouco conseguido pelos marqueteiros de plantão. Um mix de vídeos despretensiosos, com um traço singelo, uma explosão de cores e a utilização de canções típicas do cancioneiro de roda brasileiro, fez com que, mais uma vez, uma galinha azul se transformasse em unanimidade entre os pequenos na faixa de 0 a 3 anos.

 
Desta vez a galinha tem nome. Um pouco banal, é verdade, mas, a GALINHA PINTADINHA está no imaginário das crianças brasileiras. E não se trata de uma questão regional. Por todo o país a "febre da galinha" atingiu os pequenos, não respeitando quaisquer fronteiras, independente, inclusive, de classe social.

Ao presenciar no Fantástico (Rede Globo) o surgimento deste fenômeno, constatei que o "boom" da GALINHA ocorreu casualmente, tendo o material de trabalho sido recusado pelo contratante, fato que, por conseguinte, levou os seus autores a disponibilizá-lo no youtube, explodindo como blockbuster.

Daí eu pergunto: Como uma sociedade que se diz ser vanguardista consegue ser tão omissa? Como obviedades tão singelas são desapercebidas por aqueles que, por formação, deveriam ter a plena consciência?

No universo dos muito pequenos não existe margem para a segmentação. Isto significa dizer que dos 0 aos 3 anos existe uma linha homogênea de gostos e percepções que une todos os pequeninos. Ora, e o que lhes atrai? Música e cor, evidentemente. E o que oferece "A GALINHA PINTADINHA"? Nada além desta óbvia receita.

Será que temos bons educadores? Bons pedagogos? Bons publicitários? Bons artistas gráficos? Me atrevo a dizer que não.

Existe um canal fechado chamado "Discovery Kids" que utiliza inúmeros "enlatados" educativos estrangeiros que atraem mas estão totalmente dissociados da nossa realidade. Desenhos como "Sid, o Cientista", "Pocoyo", "Franlin", "Barney", "Hi-5", "Mecanimais", "Backyardgans" abusam, em maior ou menor grau da capacidade de entreter, divertir e ensinar os pequeninos. Mas o uso da simples dublagem sem correlação com a nossa sociedade tornam o aprendizado inócuo. E onde está a nossa criação nacional?

Onde estão os nossos educadores, pedagogos, publicitários e artistas do som e da imagem? Eles simplesmente inexistem. Ou estão sendo formados sob uma ótica totalmente equivocada.



Canais com um pouco mais de conteúdo nacional como o Ra-Tim-Bum ou a Tv Cultura são, simplesmente, uma lástima. O conteúdo nacional é pouco e fraco, salvo raríssimas exceções.

Chega-se ao absurdo de  percebermos que nossas crianças são "entubadas" com programas com conteúdo absolutamente em inglês que objetivam única e exclusivamente o primeiro contato com as letras e palavras  (como nos casos do "Super Why" ou do "Word World"). A tradução/dublagem seria cômica se não fosse trágica pois, ao invés de educar, acabam por confundir conceitos iniciais nos pequenos.


E não se diga que os detentores dos direitos da Galinha Pintadinha são homens de visão. O "tiro" deles parece ter sido meramente acidental. Após o sucesso estrondoso dos lançamentos "Galinha Pintadinha vols. 01 e 02" eles simplesmente pararam no tempo e deitaram nos louros.

Ora, repertório do cancioneiro infantil nacional não foi explorado nem em 30% daquilo que nossas mães e avós cantavam para dormirmos. Por quê não elaboraram os volumes 3, 4 e 5 em sequência se existia (e existe) demanda?

Observaram a explosão de diversas peças teatrais não-oficiais que lotaram (e ainda lotam) os teatros no Brasil. Iniciaram uma luta judicial contra estas, que apenas estavam "surfando" num vácuo que eles mesmo estavam deixando. Por quê não se adiantaram e/ou a estes se associaram e definiram parâmetros mínimos?


Demoraram mais de 6 meses para elaborar um musical teatral que, após lançado, não saiu do estado do Rio de Janeiro. Por quê não treinaram diversos grupos para explorar o espetáculo cobrindo uma maior extensão geográfica?

Esqueceram que o sucesso do produto lhes permite o usufruto de itens adicionais (brinquedos, jogos, produtos para festas, decoração, roupas, etc.) Apenas após 2 anos de sucesso começam a surgir os brinquedos. Quanto a decoração, festas, roupas... nada. 

Por quê a GALINHA PINTADINHA ainda não está associada a nenhum grande canal de televisão? Quem conseguir me dar qualquer explicação plausível,que se manifeste.

O que mais me intriga é que a inércia destas pessoas não eclodiu uma horda de interessados em explorar esta lerdeza (exceto no que tange ao teatro). Não seria estranho se neste intervalo aparecesse o GATINHO LARANJINHA que aproveitasse toda esta lacuna acima citada.

Enfim, cada dia mais percebo que escolhi a profissão errada. Se optasse pela educação quiçá estivesse mais rico que a Griselda, mesmo sem ganhar sozinho na loteria.

2 comentários:

Vitor disse...

O mundo da criança e seu imaginário não é tão decifrável.

E o que se percebe naqueles que produzem "os enlatados" é a visão pragmática e singular do que supostamente as crianças gostam, misturando a isso o que sabiamente mencionou: cor e som.
Sem contudo observar que cada criança é diferente e possui o seu mundo, desprestigiando o caráter educacional e pedagógico e valorizando mais o lucro!

Vou ficar lhe devendo uma boa resposta sobre o fato da GALINHA PINTADINHA não estar em nenhum canal nobre. Possa ser que em nome do dinheiro o outro sempre prefere copiar ao invés de contratar e dar o crédito de quem merece!

Fábio Iglesias Gagliano disse...

Discordo um pouco de vc.
As crianças tendem a gostar da mesma coisa.
Apenas a partir dos 3 anos de idade começam a ter gostos diferenciados. O mercado está escancarado para que os educadores possam aproveitar um vácuo e conjugar o aspecto pedagógico e comercial.
Mas os nossos educadores têm uma visão de que é pecado mortal lucrar com a educação. Não o é.
Assim, dão espaço para os enlatados, que são consumidos por nossas crianças por absoluta falta de opção, sem nenhuma vinculação pedagógica com a nossa realidade.